“A Primeira Guerra Mundial transformou-se num conflito global, embora tenha se originado na Europa, estilhaçando um século de paz (STEVENSON, 2016, p. 3).
Para muitos autores, e não são poucos, o Modernismo brasileiro forneceu insumos abundantes para estudos históricos sobre a Semana de Arte Moderna de 1922, considerada por muitos o resultado duma reflexão anterior: O que nós construímos, entre os anos de 1822 e 1922? Chato, mas a resposta é algo como: Imitamos muito bem os modelos europeus. Muito pouco ou quase nada foi feito para verdadeira construção dum projeto de nação, pelo menos no âmbito cultural.
O Centenário da Independência, além de uma efeméride, serviu-nos como a reflexão que assinalaria a urgência da construção do nacionalismo cultural inédito. Contra Cândidos e contra todos, a Semana de Arte Moderna de 1922 foi a pedra fundamental dessa construção, após a tomada de consciência de que a Europa, no início do século XX, agonizava e de que era mister (vocês devem estar pensando: deixa de ser Parnasiano, meu! Solta logo era preciso, isto aqui é só um post, não uma tese!) olhar para o pouco ou quase nada [que] foi feito para a construção de um projeto de nação.
A Europa – o elemento civilizador de nações desde o século XVI – inexoravelmente assumiu sua condição de Velho Continente, mas não tão cansada de guerra. Lá estava ela mais uma vez às voltas com mais conflito. Uma guerra emblemática, uma catástrofe artificial de cujos atos políticos resultou uma violência interétnica, entre os pacíficos europeus. A Grande Guerra[2], como ficou conhecida, fora o retrocesso ao Primitivo, julgado ainda presente em muitas de suas ex-colônias.
Márcia Velloso (2003), diante dessa dissolução do elemento civilizador, as ex-colônias tiveram que buscar novas formas de expressões artísticas: as nacionais, ainda com leve à moderada inspiração vanguardista europeia. Seria o Modernismo um legado da Grande Guerra? Era o conflito uma mensagem suicida do Velho Continente?Para Márcia Velloso (2003), diante dessa dissolução do elemento civilizador, as ex-colônias tiveram que buscar novas formas de expressões artísticas: as nacionais, ainda com leve à moderada inspiração vanguardista europeia. Seria o Modernismo um legado da Grande Guerra? Era o conflito uma mensagem suicida do Velho Continente?
Pindorama e a Grande Guerra
O Brasil e os hermanos evocaram a Doutrina Monroe[3] como um posicionamento diplomático ante o conflito geopolítico. Por outro lado, no campo das artes, James Monroe não fazia qualquer sucesso! Todos sabemos que as referências do nosso Modernismo foram o Futurismo italiano, o Dadaísmo franco-suíço e outras expressões vanguardistas europeias, que defendiam a guerra como a única higiene no mundo.
Ora, ora, ora! O que é a inspiração se não a interferência nas ideias? (Inspiração divina, nós temos; interferências diabólicas sempre as têm os outros). Foi assim que as ideias de higienização do mundo, aniquilamento de conceitos, de Tristan Tzara, Filippo Tommaso Marinetti, Ernest Ludwig Kirchner, também interferiram (ou influenciaram, como queiram) Oswald de Andrade, lá pelas bandas da rue de l’Abreuvoir, em Montmartre, pelos idos 1912. Essas inspirações vanguardistas encontraram eco na naïveté dos seus contemporâneos d’além-mar, que aceleraram o ocaso da Belle Époque, com particular interesse.
Então, qual seria o interesse dos modernistas em maratonar os acontecimentos da Primeira Guerra Mundial? Para Campognon[4], a intenção era a de aprender a romper radicalmente com as práticas culturais tradicionais – leiam-se práticas cosmopolitas da Belle Époque liberal –, inconciliáveis com (a) as expressões culturais nacionais (valorizando a brasilidade, no nosso caso) e com (b) a ideia de modernidade aliada à civilização industrial, livre dos cânones artísticos do Velho Continente.
Não foi bem assim que falou Zaratustra, mas foi bem assim que pensavam e escreviam Oswald de Andrade e Dolor de Brito, editores de O Pirralho (1911-1918). Tornando-se um veículo de divulgação do nosso Modernismo, pois defendia a urgente renovação das práticas artísticas em vigor no Brasil.
Teria sido O Pirralho uma das estratégias de relações públicas que fizeram da PR da Semana de Arte Moderna de São Paulo o principal – e durante muito tempo, o único movimento de renovação artístico cultural?
[1] A causa imediata da eclosão do conflito foi o assassinato em Sarajevo, em 28 de junho de 1914, do herdeiro do trono austro-húngaro, arquiduque Francisco Ferdinando, por um militante nacionalista sérvio.
[2] STEVENSON, David. 1914-1918: a história da Primeira Guerra Mundial. Barueri: Novo Século Editora, 2016.
[3] TEIXEIRA, Carlos Gustavo Poggio. Uma política para o continente – reinterpretando a Doutrina Monroe. Rev. bras. polít. int., Brasília , v. 57, n. 2, p. 115-132, Dec. 2014 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-73292014000200115&lng=en&nrm=iso>. access on 26 Jan. 2021. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7329201400307.
[4] Compagnon, O. 2019. Le modernisme brésilien est-il un enfant des tranchées ? In Dumont, J., Fléchet, A., & Pimenta Velloso, M. (Eds.), Histoire culturelle du Brésil : XIXe-XXIe siècles. Paris : Éditions de l’IHEAL. doi :10.4000/books.iheal.8682